sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

POEMA A BOCA FECHADA






POEMA A BOCA FECHADA

Não direi:
Que o silêncio me sufoca- e amordaça.
Calado estou, calado ficarei,
Pois que a língua que falo é doutra raça.

Palavras consumidas se acumulam,
Se represam, cisterna de águas mortas,
Ácidas mágoas em limos transformadas,
Vasa de fundo em que há raízes tortas.

Não direi:
Que nem sequer o esforço de as dizer merecem,
Palavras que não digam quanto sei
Neste retiro em que me não conhecem.

Nem só lodos se arrastam, nem só lamas,
Nem só animais boiam, mortos, medos,
Túrgidos frutos em cachos se entrelaçam
No negro poço de onde sobem dedos.

Só direi,
Crispadamente recolhido e mudo,
Que quem se cala quanto me calei
Não poderá morrer sem dizer tudo.


José Saramago- Portugal


*****

POEMA EN BOCA CERRADA

No diré:
que el silencio me sofoca y amordaza.
Callado estoy, callado quedaré,
porque la lengua que hablo es de otra raza.

Palabras consumidas se acumulan,
se remansan, cisterna de aguas muertas,
agrias penas en limos transformadas,
raíces retorcidas en el fango.

No diré:
que no merecen ni el esfuerzo de decirlas,
palabras que no digan cuanto sé
en un retiro donde nadie me conoce.

No sólo barro arrastran, no sólo lamas,
animales que flotan, muerte, miedos,
túrgidos frutos en ramos se entrelazan
en el oscuro pozo de donde suben dedos.

Sólo diré,
crispadamente recogido y mudo,
que quien se calla cuánto me callé
no se podrá morir sin decir todo.








José Saramago- Portugal


Traducción al español: Ángel Campos Pámpano

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